domingo, 15 de novembro de 2009

José Craveirinha - Grito Negro




José Craveirinha

Poeta, ensaísta e jornalista. Nasceu em Lourenço Marques (hoje Maputo), filho de pai branco (algarvio) e de mãe negra (ronga). Sendo o pai um modesto funcionário e, ao tempo da opção, já reformado, José Craveirinha teve de ser sacrificado, ficando pela instrução primária, para que seu irmão mais velho fizesse o liceu. Mas Craveirinha, que então já lia muito, influenciado por seu pai, grande apaixonado de Zola, Victor Hugo e Junqueiro, passa a fazer em casa o curso que o irmão fazia no liceu, acompanhando as lições que este ia tendo.
A sua estreia em livro deu-se com Chigubo, editado em Lisboa em 1964 pela Casa dos Estudantes do Império e logo apreendido pela PIDE, que o utilizou como prova nos processos de que foi vítima durante o período em que esteve preso (na célebre cela 1 com Malangatana e Rui Nogar, entre outros, entre 1965 e 1969).

Foi o Prémio Camões de 1991.

1ª fase: de Neo-realismo, implicando uma tradição poética narrativizada, de que é exemplo flagrante a primeira parte do livro Karingana ua karingana, justamente datada de 1945-50 e intitulada «Fabulário». Os poemas têm versos curtos. Cada poema é como que um pequeno quadro pictórico (em geral, uma cena, um ambiente, um tema). O fabulário alude, por outro lado, à tradição popular, ancestral, tribal, de contar fábulas, aqui com personagens humanas dentro, emersas em dramas sociais e pessoais. Há uma denúncia em moldes alusivos, expositivos, em linguagem descarnada, contida, não propriamente contundente. Por outro lado, a composição do tema, a imagética, porque voltadas para uma finalidade unívoca, baseadas em meios simples, apresentam-se sem grande elaboração, denunciando uma fase cronológica ainda algo incipiente, privilegiando a mensagem sobre os meios expressivos.
2ª fase: Negritude, expressa com nitidez em Chigubo (1964) e Cantico (1966). Os poemas têm versos de média ou mais extensa medida. Os predicadores e os predicatários e predicatados, em geral, são negros. A revolta e a denúncia agressiva pontificam. O «Manifesto» ou o «Grito negro» mostram como a cor e a raça negras (isto é, o grupo étnico) comandam a visão dos predicadores, que se enaltecem e têm orgulho nas suas raízes negras, africanas.
3ª fase: Moçambicanidade ou identidade nacional, de que as 2ª e 4ª partes de Karingana ua karingana, respectivamente intituladas «Karingana» e «Tingolé (Tindzolé)», são emblemáticas, e que se caracteriza pela expansividade dos poemas mais longos e dos muito longos, em que o humor e a ironia desempenham papel decisivo, sendo bastante clara a interrogação sobre a identidade dos predicadores, suas origens e herança cultural. A «Carta ao meu belo pai ex-emigrante» demonstra todas essas possibilidades de interrogar-se e interrogar o que é ser-se moçambicano.
4ª fase: de Libertação, de que resultaram dois livros diferentes, sendo um de poemas da prisão, escrito ainda antes da Independência, em reclusão, mas paradoxalmente respirando liberdade. Anote-se um exemplo de absoluta liberdade sob o peso do cadafalso: «Foi assim que eu subversivamente / clandestinizei o governo / ultramarino português». O outro livro, de homenagem à falecida mulher, é elegíaco como o anterior, de textos curtos, expondo um sentimento, um ambiente, uma ideia, um episódio, com circunspecção, concretude e lirismo, por vezes com pormenores que iluminam As características gerais da obra de Craveirinha podem resumir-se, do seguinte modo: Neo-realismo; narratividade; adjectivação luxuriante; ironia; elementos surrealizantes; Negritude; moçambicanidade.

Os temas fundamentais são: escravatura, raça, crítica à civilização ocidental, vitalismo, sensualidade, revalorização da tradição negra, culto da Natureza, animização, etc., com recurso aos modelos da Black Renaissance, Negritude e Neo-realismo, no intuito de construir uma identidade poética moçambicana.
o tom de cerrado desânimo.(cf. A poética de José Craveirinha, Ana Mafalda Leite, Lisboa, Vega, 1991, pp. 30 e 33).

Exemplos de alguns trabalhos:

Quero Ser Tambor, José Craveirinha

As Saborosas Tanjarinas De Inhambane

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